Irrita-me profundamente a mania que agora toda a gente tem de abusar dos eufemismos.
Senão vejamos: Um gago, já não é aquele gajo que... que... que... demora imenso tempo a falar: é um individuo com desordens a nível da fluência.
Um estúpido é uma pessoa com dificuldades ao nível da aprendizagem e um grande estúpido, uma com dificuldades ainda mais acrescidas.
Já ninguém é bêbado neste país, mas sim alguém que sofre de problemas comportamentais ao nível da bebida.
Esse mesmo labrego alcoolizado também não dá todos os dias um enxerto de porrada na mulher. Ela é que é mais uma das vítimas de violência doméstica.
Isto, aparentemente divertido, tem levado a uma crescente desculpabilização semântica dos criminosos, dos ladrões, dos corruptos, dos violadores e até da actuação do Governo (que consegue albergar inúmeros exemplares de cada um destes grupos).
Neste país, ninguém rouba – desvia. Ninguém aldraba – defrauda expectativas. Ninguém aumenta impostos – toma medidas de incremento. E ninguém está mais uma vez a ir ao «eufemismo mais profundo» dos portugueses – está é a pedir um esforço de contenção e abnegação aos contribuintes. Por isso, não percebo porque é que noutras formas de insulto mais prosaicas ainda não substituímos o «Vai à merda» pelo: «Por favor dirija-se ao excedente alimentar mais próximo»”. Ou o vulgar «eu quero que tu te lixes e vás dar banho ao cão», por um «eu gostaria imenso que você aparasse as suas arestas antes de banhar o canídeo».
Da mesma forma que deveríamos deixar de dizer «Que grande corno que tu me saíste» e passar a exclamar «Você, sua vítima de adultério assumida e reincidente» ou até mesmo substituir o famoso « Tu és um grande filho da p...» por «A excelentíssima senhora sua mãe é a maior mulher de negócios que eu, o meu pai, o meu tio e o grupo de forcados amadores de Coruche já alguma vez conheceu».
Só assim, poderemos dizer que somos um verdadeiro país de eufemistas, que é como quem diz: uma cambada de paneleiros.
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