Quando analisada e descrita sob uma perspectiva turística, a tourada é considerada uma afirmação de virilidade e supremacia física do homem face à besta. Para mim a tourada é a prova cabal que a estupidez e a bestialidade humanas não só não têm limites, como gostam vaidosamente de exibir essa evidência.
Não sou nenhum fundamentalista dos direitos dos animais: gosto do belo bife e da suculenta bifana, e não entro em depressão quando mando abaixo um fondue de carne, mas decididamente não gosto de tourada.
Somos muito lestos a julgar a crueldade humana quando ela é exercida sobre humanos. Montamos verdadeiros espectáculos mediáticos para difundir a sua punição exemplar: aquele que normalmente me vem à cabeça é o julgamento dos nazis em Nüremberg, mas há muitos outros “nürembergers” por aí. No entanto desculpabilizamo-nos à brava quando a nossa crueldade é glorificada, espectacularizada, e aplicada nos animais. Até parece que o facto de termos um cérebro mais desenvolvido nos dá o direito de acharmos que tudo isto nos pertence. A tourada é só um exemplo deste abuso de inquilino. Um exemplo circunscrito a Portugal e Espanha e a mais umas quantas novelas sul-americanas (estou a excluir a tourada com velcro no Norte da Califórnia, porque isso já nem se pode considerar tourada).
Sinto uma compulsão irreprimível de pontapear repetidamente as gengivas de quem me diz que a tourada portuguesa é mais “humana” que a espanhola porque (alegadamente) não matamos o touro. E quando surge a recorrente polémica bacoca dos touros de morte em Barrancos, só me apetece tornar S. Bento numa Pamplona, e fazer uma largada de touros no parlamento. Mais “humana”?? A tourada portuguesa é uma tourada apaneleirada!
Em Espanha os cornos dos touros não são protegidos; se acertarem no toureiro perfuram-no (e muito bem!). Em Portugal os touros são “embolados”, protegem-se os cornos para não ferirem ninguém. Mas que paneleirice é esta? Então não queriam provar a virilidade?
Em Espanha matam-se os touros na arena. Em Portugal não: depois de o sangrarem cobardemente com ferros e bandarilhas, salgam-lhes as feridas (alguém já uma vez colocou sal numa ferida? Experimentem...), e abatem-nos fora dos olhares alheios. E depois vêm dizer-me que é mais “humano” e ficam todos histéricos com os touros de morte de Barrancos...
Eu acho que a manter-se a estupidez da tradição tauromáquica se devia dar uma oportunidade ao touro. Em vez de fazerem as “pegas de caras” quando o touro já perdeu as suas forças, dilacerado e sangrado por aqueles bandalhos rabetas a cavalo, devia fazer-se a “pega” logo no início do espectáculo, quando o touro está fresquinho e vivaço, e ninguém o segura. E devia “desembolar-se” o touro, para a coisa ser a sério. Desconfio que a taxa de mortalidade dos participantes seria tão alta que rapidamente de decretaria o fim da tradição.
O primeiro mamífero que eu colocaria à frente do touro seria a Fátima Lopes, essa javardolas que gosta de animais peludos à boa maneira de Hannibal Lecter. O touro iria certamente ter muito gosto em toureá-la em profundidade, qual somali desenfreado, e sem mãos – só com os chifres. OLÉ!
terça-feira, abril 12, 2005
A Razão da Tourada
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